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EXPOSIÇÃO DE 07 DE NOVEMBRO A 31 DE JANEIRO - SEGUNDA A SEXTA 11H ÀS 19H - SÁBADO 11H ÀS 15H - DOMINGO FECHADO

A mostra, que tem como tema o conceito de metamorfose na arte indígena, popular e contemporânea, contará com obras de Tunga, Salmi Lopez, Nuno Ramos, Jandyra Waters, Manuel e Francisco Graciano, José Bezerra, Véio, Artur Pereira, entre outros. 

Vilma Eid

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2024 chegando ao fim. Para nós, da Galeria Estação, este será sempre um ano lembrado com alegria: nossos vinte anos de casa!!!

 

Passou rápido? Pra quem vê de fora. Para nós, foram anos de muito aprendizado e muitas realizações! Muita luta, muita "briga", mas sobretudo reconhecimento e destaque no mercado da arte, sempre tão competitivo! E isso foi possível porque o caminho foi trilhado em parceria com meu companheiro desde o início, Roberto Eid Philipp, e toda a nossa equipe.

 

2024 também para mim foi especial! Comemorei quarenta anos como galerista e ganhei a publicação Moderno / Contemporâneo / Popular / Brasileiro – O olhar de Vilma Eid, da editora WMF Martins Fontes, que conta a minha trajetória, mostrando minha coleção particular e a Galeria Estação.

 

Tem mais. Encerrando o ano, abrimos a exposição Metamorfoses e distâncias. A mostra, que tem como tema o conceito de metamorfose na arte indígena, popular e contemporânea, contará com obras de Tunga, Salmi Lopez, Nuno Ramos, Jandyra Waters, Manuel e Francisco Graciano, José Bezerra, Véio, Artur Pereira, entre outros. 

 

Ao nosso curador convidado, amigo e companheiro desses vinte anos, Lorenzo Mammì, muito obrigada.

VILMA EID

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LORENZO MAMMÌ

METAMORFOSES E DISTÂNCIAS

Esta exposição explora duas constantes da arte brasileira, e não apenas a popular: a da transformação ou instabilidade das formas; e a da distância, em dois sentidos: como afastamento ou estranhamento em relação ao espaço representado, ou como construção de formas centrípetas, fechadas, que se isolam do espaço em que são colocadas. Não se trata de duas características estanques, como se cada obra pudesse pertencer apenas a alienaçãouma delas. Em muitos casos elas estão presentes simultaneamente, em tensão dialética entre si. Mas a oposição entre elas me pareceu útil para abordar transversalmente de um material de origens e resultados tão variados. Formas fluidas, transições, ambiguidades são uma constante da arte brasileira, especialmente após a fase concretista. Mais que formas assertivas, muitos artistas privilegiam configurações instáveis que sugerem a passagem de uma forma a outra. Uma leitura já estabelecida defende que isso reflete uma condição não perfeitamente formada, entre nós, do sistema da arte e do espaço público. É plausível. Mas a literatura antropológica recente, ao apontar para a fluidez das distinções entre espécies nas culturas indígenas e para a “inconstância” estrutural “da alma selvagem” (Viveiros de Castro), talvez possa sugerir outra leitura, não oposta, mas complementar: talvez a predileção por processos de transformação não seja apenas reação criativa à fragilidade das instituições artísticas, mas também o aflorar, em momentos de crise, de um imaginário mais antigo. Talvez a influência indígena, fundamental nos primeiros séculos da colonização, seja mais resiliente do que a historiografia tradicional, dada a uma classificação baseada na influência europeia (arte colonial, Missão Francesa etc.), deixe supor. Se isso for verdade, a arte assim chamada popular, aquela que se produziu no Brasil fora das Academias e supriu as necessidades da maioria da população desde a época colonial, será um terreno de investigação privilegiado: é nela que se forma o caldo de uma cultura comum. A remissão à cultura indígena é evidente na zoologia fantástica de Chico da Silva. Chico é do Acre. Mas a milhares de quilômetros de distância, no Paraguai, Salmi Lopez, da etnia Ishir, também descreve relações transespécies: em seus desenhos, complementados por textos explicativos, xamãs que descendem de uma mãe peixe se transformam em aves, que guerreiam no céu. Às vezes a derivação da cultura indígena não é tão direta, mas o parentesco parece inegável. Manoel e Francisco Graciano (pai e filho, cearenses) são mestres na arte das metamorfoses: exploram o contorno e os veios dos troncos para criar seres compósitos, imbricados um no outro. Até um escultor dado a formas mais compactas e polidas, como Artur Pereira, em suas Caçadas sugere uma simbiose entre figuras humanas, animais e árvores. Finalmente, nos trabalhos de Véio e José Bezerra, é a própria madeira que parece se transformar, adquirindo vida animal ou humana, enquanto o artista se limita a acompanhar o processo com intervenções discretas. No pensamento ocidental, a indeterminação não é potencial de diálogo entre espécies, mas ameaça de indistinção que deve ser mantida sob controle. Sua figura exemplar é Proteu, o deus da transformação que Ulisses acorrenta para que diga finalmente a verdade. Mas a verdade de Proteu não é a de Ulisses. Ela se revela na inconstância das matérias e dos seres, que Tunga explora tanto nos desenhos alquímicos de La Voie humide quanto em sua última série tridimensional, as Morfologias. À verdade de Proteu Nuno Ramos dedicou uma série de desenhos (dois deles nesta exposição) em que um esquema formal muito simples (duas retas e duas curvas) se contamina pelos gestos e pelo contato com a matéria dos pigmentos. Uma fusão misteriosa e mais discreta é a de Jandyra Waters, que produziu na década de 1960 telas abstratas não geométricas, mas tampouco informais, cheias de sugestões zoomorfas. Waters foi muito próxima do psicanalista, crítico e colecionador Theon Spanudis, que na época defendia um abstracionismo que não se limitasse à organização racional das formas, mas se abrisse ao imaginário (talvez de leve ascendência surrealista) e aspirasse à transcendência. A segunda parte da exposição, dedicado às “distâncias”, é mais compósita. A rigor, o conceito de “distância” se aplica sobretudo à série de paisagens aqui expostas. Em todas elas há uma sensação de afastamento, quase de desterro – uma espécie de alienação do lugar, impossibilidade de pertencimento. Não acontece apenas na arte popular: grandes pintores brasileiros eruditos proporcionam a mesma sensação: Guignard, Pancetti, Koch – todos com boas razões para se sentir estrangeiros em pátria. De resto, Cardosinho, aqui presente com seis pinturas, não é propriamente um pintor popular: português, formado em filosofia e professor de latim e francês no colégio, só pintou a partir de sua aposentadoria em 1931, já com setenta anos. É como se fosse um homem do século XIX olhando a arte moderna (que conhecia por suas frequentações de Portinari e Foujita e por sua participação nos principais eventos artísticos, começando pelo Salão Revolucionário de 1931) pela janela – ou melhor, pelas páginas dos jornais e pelos cartões-postais que reproduzia meticulosamente, às vezes respeitando até o preto e branco das fotografias. A suspensão quase metafísica que caracteriza as telas de Cardosinho ecoa em outro tipo de estranhamento, o das paisagens de Júlio Martins – esse, ao contrário, figura tipicamente carioca: boêmio, carnavalesco, sem emprego fixo até se tornar cozinheiro do Hotel Avenida. Mas suas pinturas falam de outro lugar, visto de longe e do alto, com palacetes abastados cercados de canteiros bem cuidados, onde figuras elegantes de tamanho diminuto passeiam entre estátuas que gesticulam mais que elas. Tudo mediado por cores suaves, onde dominam tonalidades apaziguadoras de verde. É quase o inverso exato de Cardosinho: um século XIX imaginado por um homem do século XX. E aí cada elemento se isola, como se fosse mais nomeado do que visto. A divisão interna se acentua em Neves Torres. Ele também pinta outro mundo, mas esse existiu: tratorista na maior parte da vida e pintor, como Cardosinho, só na velhice, Neves Torres foi por um período dono de um pequeno sítio, e é desse lugar que suas pinturas falam. Seus quadros são divididos em áreas justapostas, cada uma abrigando um detalhe: homens e mulheres trabalhando ou descansando, plantações, animais – como se o pintor os extraísse um por um da memória. Mas às vezes, com pequenas modificações, as áreas de cor em patchwork se tornam bichos ou monstros. Outra narrativa, mais inquietante, surge de trás da cena bucólica. Uma boca dentuça ameaça o homem que descansa na rede; outro, à beira da lagoa, tem seu corpo transformado numa mesa. O fator metamórfico, que ameaça o mundo organizado, justifica a inserção de algumas telas de Neves Torres também na primeira seção da mostra. A tensão entre compartimentalização e transformação é bem mais dramática em Aurelino. Nele, a diagramação ortogonal da tela, que muitas vezes remete à sua cidade (Salvador) vista em planta ou em corte, tenta conter a proliferação descontrolada das imagens. É dessa maneira que Prinzhorn, no começo do século XX, descrevia a pintura dos esquizofrênicos: uma estrutura categorial rígida tentando organizar desesperadamente um material imagético extremamente instável. No caso de Aurelino, o esforço de contenção faz com que algumas dessas figuras, pressionadas pelos contornos, se enrijeçam numa postura hierática que lembra, supreendentemente, a arte refletida e autoconsciente de Agnaldo dos Santos. Mais ainda que à arte afrobrasileira, as esculturas de Agnaldo remetem à africana, que ele conheceu graças sobretudo a Pierre Verger. Estamos aqui em outro campo, que antropólogos como Philippe Descola descrevem como totêmico, em oposição ao animismo indígena. A imagem encarna uma qualidade ancestral que conserva por ser um corpo fechado, impenetrável e compacto. Até as cabeças de Conceição dos Bugres, embora evidentemente indígenas, têm esse caráter totêmico. A técnica do revestimento em cera amarela, que Conceição apreendeu em sonho, acentua seu isolamento. E a mesma sacralidade transpira das cerâmicas de Dona Isabel: suas mulheres penteadas e vestidas modernamente preservam, no entanto, a solenidade de um totem. Elas eram, originalmente, moringas, repositórios da preciosíssima água. Mas das pinturas de Neves Torres podemos também puxar outro fio: a organização por áreas justapostas lembra as esculturas de Nino, que também recorrem a figuras isoladas sobre fundos de cores variadas, numa surpreendente mistura de escultura tridimensional e baixo-relevo. Também cearense, Nino é quase o oposto complementar dos Graciano: nestes, as figuras não se fundem; nele, se relacionam à distância, como elementos de uma charada. Ressalta-se aqui outro procedimento, o da enumeração. Em Nino, ainda se trata de associação entre figuras distintas, cada uma com suas características. A unidade, nele, é narrativa, como em diferentes episódios de uma fábula. Mas pode se tratar das mesmas figuras repetidas, às vezes em posições diferentes, e unificadas por pertencer ao mesmo bloco de madeira ou por estar inscritas em formas geométricas, como nos presépios de Artur Pereira ou nas “rodas vivas” de G.T.O. Em Alcides, porém, a repetição inclui um fator disruptivo. Baiano, mas radicado incialmente em Mato Grosso, depois (desde 1992) em São Paulo, Alcides pintava inicialmente cenas bucólicas de um decorativismo delicado. O impacto da modernização começa a se revelar em telas como a da rodovia Presidente Castelo e do corte da madeira, onde as formas geométricas e as cores chapadas dos caminhões, dos galpões e das estradas cortam violentamente o ritmo pacato dos ambientes naturais. E explode em As paisagens/Os cocos, pintada já em São Paulo. Nessa tela, as figuras ovaladas sobre fundo verde, encerrando manchas brancas irregulares, talvez representem cocos abertos. O resto é organizado em fileiras: uma linha de feixes de feno embaixo, seguida por uma linha de panelas e outra de vários manufatos, dispostos como para uma venda à beira de estrada; um casal sentado em dois bancos, separados por uma linha de grama; finalmente, aos dois lados dos cocos, quatro grandes formas também ovaladas que talvez representem árvores floridas, mas que lembram também as panelas da linha inferior. A enumeração minuciosa dos objetos e a relativa simetria da composição não escondem a ameaça de um caos iminente, de um mundo rural à beira da perda de sentido. É, literalmente, um mundo em frangalhos. Félix Farfan é um artista urbano. Sente-se em casa na multiplicação de estímulos, na proliferação de objetos descartáveis, na rede cruzada de informações que se adensam até, como dizia Robert Smithson, se tornar uma casca compacta sobre a qual é possível correr. Ele tem, evidentemente, um pé na cultura underground e dela deriva o gosto, de origem oriental, pelas relações analógicas entre microcosmo e macrocosmo. Mas tudo está inscrito no círculo fechado de um sistema que se reproduz até a vertigem: nessa ótica, o corpo humano se objetifica em pranchas anatômicas; o universo, na totalidade dos produtos que a cultura de massa oferece. A mostra inclui também uma escultura de Elisa Bracher. Por sua força centrípeta, onde a tensão é gerada internamente, no ponto em que uma tora ou uma pedra se apoia na outra, muitos trabalhos de Bracher podem ser aproximados às formas totêmicas. Mas nesse trabalho, e em outros da mesma série, os blocos de madeira abrigam, em pequenos nichos, casas de barro: é como se o corpo fechado do totem embutisse a paisagem. Essa escultura em particular lembra as paisagens verticais chinesas, com suas pequenas habitações engastadas em rochedos separados por nuvens; ou então as de Guignard, cuja proximidade com as chinesas foi muita vez ressaltada. Mas os vapores se tornaram sólidos; a distância, presença manuseável. O estranhamento, um tesouro guardado.

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".... Se isso for verdade, a arte assim chamada popular, aquela que se produziu no Brasil fora das Academias e supriu as necessidades da maioria da população desde a época colonial, será um terreno de investigação privilegiado: é nela que se forma o caldo de uma cultura comum."

Lorenzo Mammì, curador

VEJA ALGUMAS DAS OBRAS EM EXPOSIÇÃO

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SOBRE A
GALERIA ESTAÇÃO

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EXPOSIÇÕES
ANTERIORES

Metamorfoses e Distâncias 

Quando: de 7 de novembro de 2024 a 31 de janeiro de 2025.

Onde: Galeria Estação

Endereço: Rua Ferreira Araújo, 625 - Pinheiros, São Paulo

Horários de funcionamento da galeria: segunda a sexta, das 11h às 19h; sábados, das 11h às 15h; não abre aos domingos.

Tel: 11 3813-7253

Email: contato@galeriaestacao.com.br

Site: www.galeriaestacao.com.br

Instagram: @galeriaestacao

Diretores

Vilma Eid

Roberto Eid Philipp

 

Curadoria

Lorenzo Mammì

 

Textos

Lorenzo Mammì

Vilma Eid

 

Diretora Comercial

Giselli Gumiero

 

Vendas

Amanda Clozel

Matheus dos Reis

 

Produção

Lu Mugayar

 

Diretora de Marketing

Luciana Baptista Philipp

 

Desenho Gráfico - Comunicação

Zion Digital Marketing

Fotos 

Filipe Berndt / João Liberato /  Germana Monte-Mor / Rodrigo Casagrande / Lucas Cruz / Gabi Carrera / Bruno Leão / Eduardo Ortega

 

Montagem

Cadu Pimentel

 

Iluminação e apoio de produção

Marcos Vinícius dos Santos

Kléber José Azevedo

 

Assessoria de imprensa

Baobá Comunicação, Cultura e Conteúdo

 

Revisão

Otacílio Nunes

 

Tradução

Maria Fernanda Mazzuco - Inglês

 

Impressão e acabamento

Romus Indústria Gráfica 

 

Agradecimentos

Elisa Bracher

Galeria Fortes D'Aloia & Gabriel

Galeria Millan

Instituto Tunga

Nuno Ramos

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